Anos atrás, me deparei com um genuíno RPG old school. Seu nome é Talislanta e a 2ª edição (que ilustra o post) foi lançado em 1989, como diz a folha de rosto. Talislanta foi lançado originalmente em 1987, por um rapaz chamado Stephen Michael Sechi que pediu 600 dólares para a família e montou uma empresa chamada Bard Games para lançar o jogo em pequena tiragem. O jogo fez um burburinho na região, e aos poucos fez relativo sucesso dentro do nicho, e se espalhou pelos EUA.
Interessante notar que
Talislanta vinha de um descontentamento que o autor estava tendo com o Dungeons
& Dragons. Isso já naquela época, criticando principalmente, as regras de
magia engessadas e as classes com tom genérico como eram apresentadas nos
livros básicos. Ele se perguntava: no que um ladino de Forgotten Realms, se
difere de um de Greyhawk? O que difere um clérigo de outro? Apenas trajes, arma
predileta e esferas de acesso? O que realmente pincela essas diferenças e dá o
tom para o personagem? Esse post não é pra debater isso, mas vale apontar que
tal discussão não é recente...
Para você ter noção, os
dizeres da campanha de marketing da 1ª edição de Talislanta era “no elves”. O
da 2ª edição era: “Still no elves”. Era uma frase que chamaria atenção até hoje
e sua intenção era clara: dizer logo de cara, que aquele jogo não trabalhava com
raças genéricas e clichês. A solução apresentada era bastante original e
elegante: cada raça era atrelada à região onde nasceu ou desenvolveu suas
habilidades, ou seja, estritamente ligada ao cenário de campanha. Quer um
exemplo? Digamos que deseja jogar com personagem capaz de realizar feitiços.
Ele pode ser um xamã drukh (tipo um
nômade místico do deserto), ou então um mago acadêmico do Lyceum Arcanun na
capital do reino (com direito a grade de matérias!), entre inúmeras outras
opções. Imagine que as classes de D&D (tendo Forgotten Realms em mente)
fossem: Ladrão da Guilda de Xanathar, Guerreiro Mercenário da Costa da Espada,
Mago Vermelho, etc.
Algumas das raças reunidas. |
Para dizer a verdade, nem tem
humanos no cenário! Algumas das raças até podem se parecer com humanos, mas ou elas
possuem pele azulada, ou é humanoide, mas com traços felinos ou aspecto
reptiliano. A bem da verdade, algumas parecem ter saído da série The Elder´s
Scrolls. Para pegar um exemplo, vou citar o thrall (que ilustra a capa do Core Book). Essa raça guerreira faz
novas pinturas no corpo sempre que “avança de nível”. Toda vez que um membro
dessa raça olha para outro, ele reconhece pelas tatuagens, cada um dos feitos
do personagem! Cada criatura derrotada, cada jornada percorrida, cada feito
heroico. Isso é muito original! São quase 90 arquétipos detalhados no livro
básico, pra ter uma noção. Esses arquétipos são mais explorados e detalhados no
World Book (que é o livro do cenário propriamente dito) e nas excelentes
Cyclopedias Talislanta (livros que detalham cada região e exploram ao máximo as
raças que a habitam). É impossível não ler esse material e não ficar inspirado!
As
mecânicas de Talislanta
A mecânica central de Talislanta
é apresentada em uma única página. Isso mesmo! Tudo se resume em três coisas:
1 – pegar seu valor ativo e
reduzir com o valor passivo.
2 – lançar 1d20 ajustado pelo
valor obtido no 1º passo.
3 – comparar o resultado com a
Action Table. Essa tabela irá dizer se houve uma falha crítica, uma falha, um
sucesso ou um sucesso decisivo.
Esse mesmo raciocínio serve
para tudo no jogo: teste de atributos, perícias, combate, magia e até combate
em massa!
Bem elegante, certo? |
Exemplo: um aventureiro
atravessa um charco e é atacado por um sinistro Macaco Alado. Esse nosso
aventureiro tem Combat Rating de +6 (índice obtido de Força + Destreza +
Velocidade dividido por 3 e arredondado para baixo). Já o Combat Rating do
monstro é +2. Logo, 6-2=4, o teste para atacar do nosso aventureiro será
1d20+4. Digamos que ele obtém um 6 no dado, +4 do Rating, resultado final de 10
(6+4). Olhando na Action Table, percebemos que isso é um Hit (half damage). Ou
seja, ele acertou, mas o golpe não foi certeiro, causando apenas metade do
dano. Próximo turno, o monstro ataca usando 1D20-4 (Combat Rating do
aventureiro +6 e o dele apenas +2). Claro que o Mestre pode aplicar ajustes
situacionais: se está escuro, se é uma emboscada, qualidade da arma, etc. Bem
intuitivo e repito: usa apenas uma tabela para todos os testes.
O sinistro Macaco Alado! |
A
magia de Talislanta
O criador do jogo, detestava o
a ideia da magia “receita de bolo” de D&D, com suas listas enormes de
magias pré-definidas. Um Dardo Místico pode atá causar mais dano se usado como
uma magia de nível mais alto, mas sempre será um Dardo Místico, certo?
Talislanta trabalha o conceito de magia flexível e customizável. O autor,
explica dentro do jogo, que depois de um Cataclismo Mágico, a magia de tornou
caótica e inconstante para sempre. O livro até traz exemplos de alguns efeitos
mais “clássicos”, digamos assim, mas a graça é: o jogador, na hora em que seu
personagem prepara um encantamento, deve definir o Magic Rating do seu efeito. Para
causar 1d4 de dano, por exemplo, o MC aumenta em 1. Para atingir um alvo a
mais, o MC aumenta mais uma vez em 1. Para ampliar o alcance do toque para,
digamos, 4 metros, +1 MC. O MC final, será o penal do D20 para verificar o
resultado na Action Table. Isso significa que um mago de 1º nível, pode
elaborar uma magia que cause 8D4 de dano, com alcance de 12 metros, mas ela
terá um MC final de 11 pontos! A chance de falha crítica é alta nesse caso, mas
é libertador o jogador ter essa liberdade em suas mãos. Por fim, efeitos
prediletos podem ser anotados em seu grimório ou pergaminho para reduzir a penalidade no teste de Magia.
Conclusão
Talislanta é em seu âmago, uma
verdadeira obra underground. Repleto de monstros únicos e bizarros, magia
perigosa para ambos os lados, geografia fantástica que foge dos padrões e um
clima old school e pulp que são muito bem-vindos. Seu mundo
é tão complexo que merece um post só para falar sobre ele. Em temos de regra, apresenta
soluções interessantes para muitos aspectos que incomodam fãs inveterados de
D&D, como o sistema rígido de magia e classes que não tem vínculo com o
cenário proposto (apesar dos kits terem tentado fazer isso de maneira confusa
no AD&D 2ª edição e os backgrounds, na
5ª edição, tentarem de maneira pouco convincente). Nicho dentro do nicho,
Talislanta “come pelas beiradas”, que sobrevive com seus fiéis jogadores
espalhados pelo mundo, que reconhecem a elegância das regras e o charme do
mundo. Eu sou mais um deles...
Se ficou curioso, anos atrás o material foi liberado pelo autor através desse LINK.
OBS: em breve, teremos resenha de outros livros sobre Talislanta aqui no blog.
Abraço a todos e bons jogos!
Que maneiro esse artigo! Obrigado
ResponderExcluirValeu, Rafael! Que bom que curtiu. O autor liberou anos atrás, download do material por esse link: http://talislanta.com/?page_id=5#2nd
ExcluirGrande Abraço!
Bem bacana a resenha. E obrigado pot divulgar o link ja estava pensando em como conseguir essa raridade...
ResponderExcluirValeu Bernardo. Recomendo experimentar mesmo. Material excelente esse aí. Abraço!
ExcluirBem legal! A Action Table me lembrou (de forma beeem mais econômica) aquela tabela colorida de resolução que é usada em Tagmar, em termos de funcionalidade.
ResponderExcluirDe fato lembra! Tabelas de resolução eram bem comuns nessa época. Grande abraço!
ExcluirBem interessante esse rpg e esse mundo desenvolvido!
ResponderExcluirQue bom que curtiu. Em breve, resenharei os suplementos dele.
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