segunda-feira, 29 de outubro de 2018

Resenha: Refúgio



Em agosto a Editora Jambô lançou o último livro da Trilogia do Elfo Negro, depois de um hiato relativamente curto entre os outros e isso é ótimo! A saga, que visa contar as origens do elfo negro mais famoso de Forgotten Realms, desde seu treinamento em Menzoberranzan, a cruel cidade dos drow. A saber, os outros livros já foram resenhados aqui: Pátria e Exílio. O post abaixo, pode conter leves spoilers:

Gosto de pensar que essa trilogia possui temas bem claros: o primeiro volume trabalha a construção de um senso moral para nosso protagonista, pontoando claramente, quais as linhas que ele não cruza. O segundo é a aplicação dele e onde as linhas morais são esticadas ao extremo, mas Drizzt luta com todas as suas forças para não rompê-la. Agora em Refúgio, vemos a maturação desse senso de justiça e a busca por um lugar onde exercer esse moralidade. 

Refúgio, inicia-se exatamente do gancho deixado no final do segundo: Drizzt chegando na superfície. Mais precisamente, nos vales ao redor de Mirabar, onde mesmo a distância, o drow começa a se apegar à uma família de camponeses. Ao longo do percurso, Drizzt faz inúmeros inimigos, mas nenhum é mais terrível que o ser humano e a solidão. Eu considero os livros do R.A. Salvatore bem young adult, mas todos brilham em momentos de maturidade ao abordar tais aspectos. Principalmente nos interlúdios, que representam os monólogos filosóficos de Drizzt. É nesse livro também que temos a grafia da pronúncia do nome do protagonista: “Drizzit” – dito pelo membro mais jovem da família de fazendeiros. O tormento vindouro dessa tentativa de aproximação, assombrará o elfo negro para sempre.

Nessa dura jornada em busca de um lar, Drizzt conhece muitas pessoas: anões, um detestável humano caçador de recompensa, um druida cego e bem experiente (que o ensinará o caminho do ranger), a carismática e ainda pequena Cattiebrie (filha adotiva de Bruenor) e inclusive um grupo de aventureiros que parte no encalço do drow, que sempre em fuga, nunca encontra um lugar para se estabelecer.

Entre outros pontos que gostaria de destacar, estão o fato de que os itens mágicos obtidos na famigerada cidade drow estão se enfraquecendo e deteriorando, coisa que de fato acontece com itens mágicos forjados pelas Casas dos elfos negros, que encontram a luz do sol. Lá pra segunda metade do livro, Drizzt se junta aos Frades Penitentes, uns eremitas bem carismáticos que garantem cenas com um Dragão Vermelho, digna do Hobbit. E Bruenor e sua filha que realmente roubam a cena, demonstrando sensibilidade e até mesmo resgatando parte da inocência perdida de Drizzt e isso é muito bem construído. 

Por fim, o livro, em suas quase 380 páginas fecha um ciclo importante de lançamentos. Muito legal ver que a Jambô está fazendo um trabalho que havia sido descontinuado pela Devir. Tomara que eles tragam romances de Dragonlance! Felizmente, como está escrito na última página de Refúgio: Drizzt Do´Urden voltará. Ou seja, teremos as outras sagas por aqui. Resta saber se eles vão pular a segunda trilogia (lançada anos atrás pela Devir) ou se vão relançar a Trilogia do Vale do Vento Gélido com a mesma identidade visual (o que seria o ideal). Abaixo, a relação dos romances na gringa, lembrando que por enquanto, temos as duas primeiras sagas em português:



Abraço a todos e boa leitura.

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Nostalgia: Blacksand



É incrível o sucesso que os posts sobre os materiais da série Aventuras Fantásticas fazem aqui no blog. É notável o carinho que muitos fãs ainda possuem por esse sistema simples e cativante. Nada mais natural de dar continuidade com mais uma resenha nostálgica, dessa vez com Blacksand: o segundo volume da série, lançado em 1994 (um ano depois de Dungeoneer) pela editora Marques Saraiva. Logo de cara, podemos perceber que Blacksand tinha 4 objetivos bem distintos: trazer novas opções para os jogadores, apresentar ferramentas para criar NPCs, vilarejos e cidades com personalidade, descrever em detalhes o Porto Blacksand, um cenário urbano bastante rico e perigoso para os aventureiros e por fim, trazer a mega aventura "Uma Sombra sobre Blacksand", uma campanha completa, repleta de traição e investigação no cenário proposto.


Entre as novas regras, temos novas Habilidades Especiais e algumas readaptadas para o cenário urbano. Temos agora, Conhecimentos de Cidades, das Leis, Sinais Secretos, entre outras. Ponto alto para a Habilidade Especial chamada Magia Inferior, que são pequenos truques e efeitos úteis, que servem bem para um NPC xamã, ou um pequeno mago, um velho eremita, etc. Em Titan, um bardo é simples menestrel. Mas se o Mestre desejar um bardo próximo ao de D&D, pode aplicar essas Magias Inferiores para tal. Entre elas, estão por exemplo: Flautista Encantado, Calor, Azedar, Remendar e outros. Além disso, explica que quase todas todas as magias de TITAN, podem ser lançadas com seu efeito inverso, ao custo extra de 1 ponto de Energia (ou 2 pontos se a magia for bastante poderosa). 

Ainda sobre magias, Blacksand nos traz oficialmente, a opção de montar um clérigo. Para tal, a mecânica é idêntica ao explicado no meu post sobre Dungeoneer, mas o livro traz na página 48, uma lista exclusiva de magias sacerdotais. Detalhe para a magia Chamar Ser Sobrenatural que funciona exatamente como nas histórias pulp. Remete-me na hora, ao Sacerdote Vermelho nas histórias do Conan, invocando dentro de seu templo, a entidade Anu, o deus touro. Estranhamente, um feitiço tão clássico do gênero e é pouco abordado em outros jogos. Naturalmente, as páginas seguintes trazem a relação do panteão e respectivos aspectos, avatares, cores e feitiços proibidos pelos dogmas. Quem leu o TITAN e o romance "As Guerras de Trolltooth", vai se lembrar dessas divindades.

Entre as outras regras apresentadas, estão a Escala Social do Personagem, onde joga-se um dado para verificar se o PC/NPC pertence a classe social de camponês, fazendeiro, trabalhador, artesão, mestre artesão ou líder. A seguir, ferramentas para criar aleatoriamente povoados e cidades. Há tabelas para criar a população, os estabelecimentos existentes no local, que tipo de negócio os aventureiros podem encontrar, gerar qualidade das tavernas e número de frequentadores (por hora do dia). A tabela de criação de personalidade de NPCs é uma das mais completas que já vi!

O próximo capitulo, aborda o Porto Blacksand propriamente dito: com um mapa completo, mapa por seção da cidade, timeline dos principais eventos, e as construções, serviços e NPCs que podem ser encontrados em cada um dos distritos. Toda a cidade-estado, governada pelo misterioso e maligno Lorde Azzur (sua história é contada em detalhes no livro Titan - O mundo de Aventuras Fantásticas e merece um post próprio). Lorde Azzur é o responsável por transformar Blacksand em um reduto de bandidos, piratas e nobres corruptos. Entretanto, é o local certo para os personagens obterem informações, equipamentos raros, serviços escusos e contatos que não julgam seus métodos. Temos muita informação para elaborar aventuras dentro de Blacksand: como a lei funciona, quais as guildas operantes e as famílias mais influentes que conspiram entre si e até gangues de rua. O capitulo ainda aborda as moedas correntes, sistemas penais e as taxas de câmbio para quem vem de fora. Temos até mesmo um gerador de clima e um gerador de ganchos de aventura para a cidade, dignos de um RPG old-school.

Por fim, Blacksand fecha com uma enorme aventura de intriga urbana em mais de 100 páginas. "Uma Sombra sobre Blacksand" funciona perfeitamente como introdução ao cenário e como campanha completa, se passando toda na famigerada cidade-estado e arredores. Se os jogadores passarem a usar Blacksand como base de operações, melhor: o livro espera que isso aconteça e oferece muito material para tal. Sendo assim, Blacksand é um cenário incrível até hoje. Suas tabelas e ideias, podem ser usadas com seu jogo favorito. A propósito, Blacksand tem a arte interna do incrível Russ Nicholson (que é um dos artistas do Dungeon Crawl Classics, diga-se). Seus desenhos estabelecem diante dos seus olhos, o clima proposto pelo jogo: Titan é um mundo sujo, misterioso e perigoso.

Infelizmente, o terceiro e último livro da série, Allansia, nunca veio para o Brasil e até o importado é bastante raro hoje em dia. Allansia traria mais uma remessa de regras novas (entre elas novas raças jogáveis e combate em massa) e abordagens para aventuras nos ermos selvagens. Mas anime-se: nossas resenhas não acabaram. A próxima, será sobre o bestiário de Aventuras Fantásticas: o Out of Pit - Saídos do Inferno.

Abraço a todos e bons jogos.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Nostalgia: Dungeoneer


Depois de falar de TITAN e dos clássicos livros-jogos, nada mais natural falar do RPG lançado pela Editora Marques Saraiva: o Dungeoneer. Esse era o livro que trazia todas as regras avançadas para seus jogadores montarem os heróis em Titan, com regras expandidas das já apresentadas nos livros-jogos. Curioso observar que as editoras gringas (a TSR com o AD&D e a linha Fighting Fantasy com o Dungeoneer) tinham a duvidosa estratégia de vender esses livros como “regras avançadas”, seja no nome ou como um selo impresso na capa, o que era um tremendo desserviço, pois intimidava e afastava iniciantes.

Enfim, Dungeoneer, atingiu as prateleiras brasileiras em 1993 e em suas quase 400 páginas apresentava um sisteminha bastante simples, trazia ainda aventuras prontas, dicas para o Mestre, listas de magias e equipamentos e em suas últimas páginas, personagens prontos. Infelizmente ele fazia de maneira confusa: navegar pelo livro é uma verdadeira “dor de cabeça”. Percebe-se que os autores (os ingleses Steve Jackson e Ian Livingstone), queriam que durante a leitura, o jogador tivesse uma experiencia didática e orgânica, mas na prática, um livro de regras de RPG não funciona assim. Logo, o livro reveza entre informações para o Mestre, informações para os jogadores, aí entra uma aventura pronta, depois regras simples, depois mais informações e dicas, depois regras complexas, e pra finalizar uma segunda aventura pronta. Confuso, certo? Mas não se engane: eu apenas quis tirar os pontos negativos da frente logo de cara. Dungeoneer é um RPG simples extremamente divertido e inspirador!

A ficha é bem simples e isso é ótimo!
Usando apenas dados de 6 faces, 3 atributos, uma ficha minimalista, e uma arte PB fantástica, o jogo é capaz de emular um incrível clima old school. “Mas então: apenas 3 atributos?” – você pergunta. Sim, os mesmos dos livros jogos: Habilidade (que representa a tanto a Agilidade quanto a Sagacidade do seu personagem), Energia (que funciona como Resistência e Pontos de Vida) e a Sorte. Esses aspectos funcionam muito bem, por serem abstratos. Isso garante que por exemplo, uma porta pesada possa ser aberta usando força bruta ou que você ignore ela e escale a torre por fora. Ambas as tarefas, são resolvidas com o mesmo atributo, mas pela a abordagem dada pelo jogador e sua imaginação, criaram resultados diferentes DENTRO da história. A sua constituição representar diretamente seus pontos de vida é uma sacada bastante elegante também. Quanto mais dano recebeu, mas difícil será resistir à um veneno, por exemplo. A Sorte é o quão favorecido dos deuses, o personagem é. O mestre pode solicitar um teste de Sorte para determinada situação ou o próprio jogador, mas toda vez que o fizer, ele reduz 1 ponto de Sorte, automaticamente. Conan ao invocar Crom, por exemplo.

E se eu quiser montar um personagem capaz de utilizar magia? Simples: ele anota Magia como uma de suas habilidade Especiais e destina pontos de seu próprio Atributo Habilidade para ela, mas diferente de outras habilidades especiais, esse valor despendido será REDUZIDO no total final do atributo. Logo, se o seu personagem deseja ser um mago, e ele tem Habilidade Inicial de 10, pode distribuir seus 10 pontos normalmente entre as Habilidade Especiais, colocar Magia 5 e no final do processo, reduzir o total do atributo em 5 pontos. Isso representa os anos de treinamento em laboratório ou em uma escola de magia, por exemplo.



Ainda falando de magia, o Dungeoneer opera com um sistema de Magia bem interessante. Não é “vanciano”. O mago pode logo de cara, encontrar ou ter acesso a magias bem poderosas, mas cada uma possui custos de Energia. O livro recomenda de custos até 4 pontos. Quando essa mana “esgotar”, nenhum efeito poderá ser realizado. Lembra a magia usada por Raistlin em Dragonlance. Além disso, cada efeito realizado, o mago deve passar em um teste de magia. Uma falha crítica nesse teste, pode ter resultados desastrosos, digno das tabelas do Dungeon Crawl Classics. 


O combate tem nuances bem inteligentes também como comparar o valor de ataque e defesa. Se o atacante superou nesse total, pega-se a diferença e verifica-se de acordo com a arma usada numa tabela específica para verificar o dano causado. Dica: separe uns marcadores de página para agilizar a consulta a essas tabelas, pois elas ficam espalhadas pelo tomo, como citei.

O livro básico junto com o Livro dos Monstros e o Cenário de Campanha.
O livro assume que os personagens serão humanos, pois eles são maioria em Allansia, mas ainda traz regras para anões e elfos, apesar de reforçar que aventureiros dessas raças são extremamente raros. Esse tipo de afirmação simples, por exemplo, ajuda muito ao criar o clima fantástico e misterioso para o grupo, logo de cara. Entretanto, se visar algo mais high fantasy, outras raças podem ser criadas fácil e rapidamente nesse conjunto de regras. Outro ponto positivo é que o conjunto de regras é bem flexível e versátil. Sem aspectos restritivos como classe de personagem, por exemplo, sendo assim possível, criar um espadachim que usa algumas magias (como Elric), sem dores de cabeça ou mecânicas complicadas para tal. Para os entusiastas da escola véia (como diz o Tio Nitro), e os saudosistas das Aventuras Fantásticas, é impossível não ficar inspirado com a arte de John Sibbick.
 
O sistema e a arte combinam muito bem com Lankhmar.
Inquestionavelmente, Dungeoneer hoje é considerado um clássico. Se tiver a oportunidade de encontrar esse livro a um preço em conta, não deixe de pegá-lo. Um sistema simples e divertido, pena que usa páginas demais pra afirmar isso...
Em breve farei uma resenha sobre o Out of the Pit, o livro dos monstros de Dungeoneer. Abraço a todos e bons jogos.