terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

True Detective – 3a temporada (EPI 08)




O texto abaixo contém spoilers do episódio.

“Now Am Found” marca o season finale dessa terceira temporada de True Detective. Nos trazendo um desfecho fora da caixa, que se esquiva de clichês e exigindo uma percepção além dos nossos olhos, para decifrá-lo. Tratamento esse, bem-vindo para o gênero, na minha opinião. Enquanto assistia, estava achando o episódio arrastado, mas quando ele engrena com as respostas, o discurso metafísico e o clima onírico, percebe-se que estamos diante de uma obra rara.

Nesses últimos passos, acompanhamos os detetives no rastro de Junius Watts, o negro cego de um olho que serviu quase toda a vida à família Hoyt. A história que ele conta é a verdade mais rasa: aos olhos dos ingênuos, ele pode soar até triste. Quando a matriarca da família perde sua filha e marido em um acidente de carro, seu pesadelo tem inicio. A base de lithium, a única coisa que a tira do torpor é a visão de Julie, cuja aparência lembrava bastante a filha perdida. Logo, Lucy (a mãe verdadeira), começa a receber dinheiro dos Hoyt para que Julie passasse um tempo com a matriarca no bosque.



Isso se tornou uma verdadeira obsessão, e então eles decidem raptar a pequena Julie, que Isabelle continuava a chamar insistentemente de Mary. Quando Will tenta evitar o sequestro da irmã, Junius Watts, o empurra, esmagando a cabeça dele contra uma pedra. A família Hoyts então, paga para Harris James encobrir a morte do menino e plantar pistas falsas. Além disso, é possível assumir que ele é o responsável por matar Dan O´Brien, Tom Purcell e até Lucy, aparando todas as possíveis “pontas soltas”. 


A partir desse ponto, tudo dá errado no plano de Isabelle, que mantinha Julie drogada e dissociada, tentando programar a menina para acreditar ser Mary do Castelo e do Quarto Rosa, culminando no suicídio de Isabelle, quando Julie foge. A porta foi deixada aberta naquela noite por Watts, por pena. Anos depois, Junius ainda vai atrás de Julie para saber como ela estava, mas seus rastros terminam no convento de freiras, onde Julie aparentemente faleceu, vitima de HIV.




Esse é o final “oficial”. Mas Amelia, que definitivamente é a investigadora-chave do caso, surge para o velho Wayne e indaga: “Mas e se esse final, não for o verdadeiro final?” Perceba que Amelia é crucial não na investigação pura e simples, mas na obtenção da verdade. Ela é o avatar da memória perdida de Wayne Hays, ele teve que deixar seu orgulho de lado, ler a obra da esposa, para entender que ela havia deixado as peças perdidas, ali para ele. E essa verdade, canalizada por ela, continua com o menino Mike Ardoin, que era amigo próximo de Julie na infância e a reencontra no convento. Ele é o menino que acena para Julie antes dela desaparecer nos anos 80. E seu pai, já nos anos 90, trabalhava como paisagista do convento. Amelia então fecha a história para o velho Wayne. Lhe dando a última peça do quebra-cabeça. Peça essa, encontrada, quando Wayne dirige até o endereço de Mike Ardoin e se depara com Julie crescida e sua filha, levando uma vida idílica. Um final feliz no final das contas. Justamente na hora em que sua mente o abandona. O papel com o endereço fica nas mãos de Henry, o filho policial de Wayne, logo cabe a ele decidir o que fazer com a última peça do caso. Seu pai, já fez a escolha.



Nota-se também que esse, é um episódio de redenção, tema importante no gênero: redenção quando os detetives decidem não matar e nem prender Junius Watts (erro que cometeram com Harris e os assombraram para sempre), redenção quando Wayne decide deixar Julie vivendo sua vida em paz (sem levar o desfecho real do caso, para a mídia) e redenção para Roland que é um personagem trágico como o Roland do poema de Robert Browning. Se nos primeiros episódios, ele queria atirar em um bichinho no ferro-velho, agora ele se redime ao acolher um cachorro de rua e muitos outros (como vimos). Deixando a maldade e o niilismo para trás. Falando em Roland, seu innuendo homossexual está bem visível nesse episódio final, mostrando sua frustração quando Wayne abandona o caso no final dos anos 90, e do afastamento do amigo, sugerindo uma atração platônica pelo parceiro.
 
Roland e o doguinho. Essa cena é bonita de fato.
Por fim, o desfecho dessa temporada também rima com o final da primeira. O caso é encerrado para as autoridades, mas não para nossos detetives que sabem da verdade. O mal ainda espreita, o Rei de Amarelo ainda está lá, mas ao invés de cair na agenda niilista tão em alta, o discurso da série oferece conforto para Wayne e conexão entre os detetives. A vida é um quebra-cabeças, a passagem do tempo uma ilusão e talvez nossos olhos podem ser enganados, mas não o nosso coração. Justamente a pauta elaborada por Rust Cohle lá atrás.  



A cena final é linda: onírica e simbólica, onde a câmera nos guia para dentro da mente de Wayne. Que por sua vez, é levado por Amelia para atravessar o limiar entre a vida e a morte. Mas o tempo não é linear, lembra? Por isso ela também fecha com Wayne no Vietnã. Será que é ali que ele mata os homens que o assombraram? Será até mesmo, que ele morreu ali? Como e quando, Amelia morreu? Simplesmente não importa. Essa metafísica bem executada, é o que torna True Detective um dos seriados mais intrigantes da atualidade. Que venha a quarta temporada.



Abraço a todos!  

2 comentários:

  1. Po. Achei muito foda a temporada, mas eu acho q aquela mulher que o Wayne encontra não é realmente a Julie. Acho q ela morreu mesmo.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É a Julie sim, ela reencontra o namorado de infância e eles se casam. As freiras fazem uma "queima de arquivo" para Julie "sobreviver" de maneira anônima. Abraço.

      Excluir