segunda-feira, 30 de julho de 2018

Aventura do RPG no Brasil - O Primeiro Livro


Olá, pessoal! Estou de volta ao Tomos de Sabedoria para apresentar uma nova coluna: A Aventura do RPG no Brasil.

A ideia aqui é muito simples, vou trazer conteúdos que falem sobre a história do nosso hobby aqui em terras brasileiras. Podem ser textos, entrevistas, resenhas, várias coisas, o importante é que tudo que aparecer aqui terá relação com o tema. Introdução feita, vamos ao primeiro assunto.

Como essa é a primeira coluna, vamos começar falando da primeira coisa relacionada a RPG que saiu oficialmente por aqui. E não foi D&D, não foi Dragon Quest, não foi Hero Quest, tampouco os livros da série Aventuras Fantásticas. O primeiro lançamento RPGístico em terras brasileiras foi o livro-jogo Lobo Solitário – O Fugitivo das Trevas, escrito por Joe Dever com ilustrações de Gary Chalk.

Pioneiríssimo!
Trazido pela editora Bertrand Brasil em 1989, Lobo Solitário – O Fugitivo das Trevas tinha tudo que a série Aventura Fantástica apresentaria um ano depois com Cidadela do Caos, seu primeiro lançamento no Brasil.

“Essa coleção da Bertrand Brasil (...) já tem os elementos que a gente vai ver no próprio Fighting Fantasy. Tem uma planilha um pouco diferente. Já tem aquelas ilustrações fantásticas que fizeram sucesso na década de 1990.” (Canal do Youtube Dungeon 90 - https://youtu.be/tmLzQ3-sG9Q?t=10m6s)

Lançada originalmente nos EUA em 1984, o livro apresentava regras mais complexas do que as vistas na série Aventuras Fantásticas, inclusive permitindo que o jogador montasse seu personagem e escolhesse habilidades especiais para usar durante a aventura.
Outra coisa digna de destaque é que os livros da série contariam como uma única campanha, ou seja, você poderia começar o livro seguinte com todos os itens e habilidades que tinha no anterior.

Apesar do pioneirismo, a Bertrand Brasil não trouxe as continuações da série Lobo Solitário.  Anos mais tarde, vendo o sucesso que conseguiu com a série Aventuras Fantásticas, a editora Marques Saraiva relançou o primeiro livro com o título Fuga da Escuridão em 1995 e trouxe o restante da série nos anos seguintes.

Desculpem pela qualidade ruim,
foi o que deu pra achar
Por hoje é só, pessoal. Obrigado por lerem a nova coluna e podem esperar pela próxima logo mais.

PS: Ficou curioso para jogar? O livro está oficialmente disponível de forma gratuita na internet em vários formatos. Infelizmente, ele não possui versão em português.


terça-feira, 24 de julho de 2018

Resenha: Carcosa


Carcosa é para poucos. Um cenário extremamente alienígena e maligno. Escrito por Geoffrey McKinney (primeiramente em forma de panfleto/zine) e posteriormente, lançado em formato capa-dura, sob o selo de Lamentations of the Flame Princess (óbvio!), em 2011.

Pelo nome, já podemos associar o cenário com as obras de Ambrose Bierce (leia o conto "An Inhabitant of Carcosa", escrito em 1886) e com a mesma mitologia retrabalhada depois por Robert Chambers (nos fragmentos da peça O Rei de Amarelo) e incorporado aos contos lovecraftianos posteriormente. Então sim, espere encontrar nesse mundo de campanha, criaturas saídas dos mythos, rituais extremamente vis e poderosos, mas que podem levar à corrupção do feiticeiro e finalmente à insanidade. 


Nesse cenário, apenas duas classes de personagem são nativas de Carcosa: o Guerreiro (idêntico ao apresentado no livro básico do Lotfp) e o Feiticeiro (nova classe apresentada aqui). O autor ainda deixa claro que o Especialista (classe exclusiva do Lotfp) também pode ser inserido sem perder o tom proposto. Mas perceba que eu disse classes de personagem NATIVOS. Nada impede que o Mestre carregue seus jogadores de outros mundos para Carcosa. Basta um portal perdido, a leitura de tomos proibidos ou a ativação de um artefato estranho e voilá: o grupo se vê diante dos horrores cósmicos mais nefastos possíveis!

Além disso, o livro apresenta regras bem interessantes para abordar Psiônicos. Diferentemente do que vemos por aí, para possuir poderes mentais não há uma classe de personagem para isso e sim, um cálculo que leva em consideração seus atributos mentais (Inteligência, Sabedoria e Carisma) para criar uma chance de você possuir esses dons de maneira aleatória. Quanto maior forem esses três atributos, maior a chance de possuir habilidades psíquicas. Ou seja: qualquer classe é capaz de desenvolver tais faculdades mentais. É uma ferramenta tão boa que penso em usá-la para para minha adaptação de Dark Sun para Dungeon Crawl Classics.


Entretanto, o foco do livro é a exploração de Carcosa através do famigerado hexcrawl. O material nos apresenta uma boa parte daquela terra nefasta e deixa muito espaço para o Mestre criar. É através dessa exploração que o Mestre vai dar o tom perturbado da obra, percorrendo essa terra desolada, o grupo encontrará artefatos alienígenas e tecnologias perdidas, os personagens ainda poderão sofrer as mais variadas mutações (com direito a tabelas aleatórias para tal). Ainda nessas andanças, o Feiticeiro vai encontrar novos rituais e nesse ponto é que o livro se tornou polêmico nos blogs gringos.



Muitos rituais envolvem sacrifício de terceiros. É um tema bastante pesado e demanda maturidade. Sacrifício de crianças e outros inocentes é algo bastante perturbador e muitos grupos certamente terão problemas para abordar tal assunto (e com razão!). Por isso eu disse no enunciando que Carcosa é para poucos. Mesmo que o Mestre trabalhe dilemas morais e faça um esforço para tratar como “sacrifício de poucos para a salvação de muitos”, ou mesmo “o menor de dois males”, ainda assim é coisa pesada para quem estava jogando um Eberron colorido ou um Forgotten Realms cheio de magos bonzinhos e vilões de tapa-olho (nada de errado aqui, ok?). Temas como loucura podem ser menos pesados, mas devem ser tratados com igual seriedade. Em muitos jogos, o estado de loucura é traduzido simplesmente como algumas penalidades para o personagem. Aqui não. Um personagem insano em Carcosa passará a praticar canibalismo, escutar vozes para executar determinados rituais e coisas bem piores.


O resto do livro são as entradas para a exploração de cada hexágono do mapa (há duas entradas para cada um), mas lembrem-se sempre da máxima do Hexcrawl: não existe, no hexágono, APENAS o que está escrito, é apenas um exemplo de encontro principal, ou mesmo uma sugestão. É trabalho do Mestre, dar vida a essa experiência e tornar esses encontros o mais orgânico possível (eu falei um pouco mais sobre isso NESSA RESENHA).

As últimas páginas reservam-se para as tabelas de encontros aleatórios (contendo criaturas oriundas dos mythos), tabelas para a criação de tecnologias perdidas, crias de Shub-Niggurath e as Mutações. Usando essas tabelas, você nunca encontrará duas tecnologias ou crias idênticas e isso é bem bacana. Só de criar uma criatura que emana gás radioativo, cheia de olhos e que se desloca pelo teto, já cria situações únicas para a sua aventura e sempre um desafio novo para os jogadores. Depois de um tempo esgotado, o livro voltou aos estoques e pode ser encontrado NESSE LINK.

Abraço a todos e bons jogos.

segunda-feira, 9 de julho de 2018

Nostalgia: 3D&T Manual Vermelho



Na sessão nostalgia de hoje relembro o famigerado Defensores de Tóquio 3ª edição. Alguns chamam de 3D&T Manual Vermelho, ou simplesmente 3D&T da Capa Vermelha. Vale lembrar que na época, esse RPG nacional, já possuía certo renome, sua primeira versão era a revista com as paródias dos heróis japoneses (uma revisão posterior com a mesma proposta) e anos depois, uma revisão mais apurada das regras para adaptar temas mais “sérios”, como Street Fighter, Darkstalker e Mortal Kombat. Atente também que até mesmo na edição especial de 50 números, ao qual o Mundo de Tormenta fora lançado, ainda não tínhamos o Manual Vermelho. Mas logo percebeu-se a necessidade de um livro básico para o amigável sistema.

Dez edições depois, precisamente em março de 2000, a revista Dragão Brasil colocava nas bancas, o retrabalho do sistema, a compilação definitiva de todo o material espalhado entre artigos e edições especiais. Tornando o 3D&T, oficialmente, um jogo simples, rápido e o mais importante: acessível. Trocando o humor satírico e escrachado por temáticas mais abrangentes (entretanto, mantendo uma identidade visual leve e tom bem-humorado). Qualquer um poderia comprar o livreto de 100 páginas na banca mais próxima, ler seu conteúdo em uma tarde e sair adaptando o que desejasse. O resultado todos nós sabemos: sucesso absoluto, ao ponto de receber novas reimpressões e mais tarde, novas revisões de regras, versões estas, que foram refinando o sistema, mas se distanciando, em vários pontos, daquele antigo Capa Vermelha, nosso foco de hoje.


Gosto de pensar que o jogo estava a frente de seu tempo em vários aspectos e sempre gosto de apontar pelo menos 3 pontos que deixam essa afirmação bem clara:

1 – Atributos abstratos

Hoje em dia, estamos rodeados de jogos narrativistas com regras bem flexíveis e genéricas (de propósito), para justamente ajudá-lo na hora de adaptar determinado tema. Logo, no 3D&T, um ninja poderia ter o atributo Poder de Fogo (PdF) igual a 2 (para representar suas shuriken) e enfrentar uma menininha mágica com um báculo místico de PdF 4. Fazendo isso, o jogo soltava a mão do simulacionismo utópico que muitos jogos tentam emular para dar as boas-vindas ao non-sense das mídias japonesas. Se livrar de tabelas de armas e equipamentos em prol das afetações dos animes/mangás foi um baque forte até para os jogadores veteranos da época! Isso poupava bastante trabalho para os Mestres.



2 – Regras modulares

Como o GURPS, antes do inicio de qualquer aventura ou campanha, o Mestre tinha que olhar a lista de vantagens, desvantagens e perícias e ver o que funciona ou não, na proposta desejada. Alguns por motivos óbvios vão sair (por exemplo, a vantagem Arcano para uma campanha no cenário de William Gibson), outras terão que ser adaptadas ou mesmo criadas do zero. Bastava pegar uma folha de caderno e listar o que era aceito dentro da proposta determinada. Logo, adaptar seu jogo, filme ou anime preferido era perfeitamente possível e até divertido de fazer. Além disso, por ser um jogo também estabelecido em pontos de personagem, o Mestre deveria previamente, escolher quantos pontos cada jogador teria disponível para a criação e customização de seu personagem.  


3 – Um jogo para todos os gostos

Esse terceiro item é apenas a consequência natural dos dois outros. Por ser um jogo de atributos abstratos e composto de regras modulares, era simples ter o controle completo sobre o 3D&T e por isso, vi muitas mesas, no mínimo inusitadas, se formando na minha cidade. Vi gente jogando Cyberpunk com ele, Cavaleiros do Zodíaco, Marvel Super Heroes e pasmem: Vampiro: A Máscara, com cada Disciplina funcionando como um Foco de Magia. Eu mesmo, joguei uma incrível campanha de Final Fantasy 7, que meus amigos lembram até hoje. Por fim, era um jogo simples, divertido e completo. Que aceitava, pelo menos ao meu ver, qualquer proposta e tom, bastando o grupo certo, dedicação por parte do Mestre e boa vontade. Porque o sistema sim, era capaz.

Como mencionei, ao longo dos anos, o sistema sofreu várias alterações e versões. Tenho todas elas e sei que cada uma possui seu charme. Mais para frente, irei mencionar as outras. Basta saber que esse Manual Vermelho em especial, possui um lugar reservado em minhas memórias, pois era um joguinho divertido que eu botava na mochila junto com um punhado de dados de WAR e ia pra escola jogar nos recreios.

Abraço a todos e bons jogos!